Bexiga Neurogênica

INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES

Lesões ou doenças do sistema nervoso são causas frequentes de distúrbios vésico-esfinctéricos, podendo ter um importante impacto na qualidade de vida dos seus portadores como também determinar o aparecimento de complicações como infecções do trato urinário (ITU), retenção urinária e deterioração do trato urinário inferior e superior.
A avaliação de pacientes com distúrbios miccionais neurogênicos requer um bom entendimento da fisiologia da micção, bem como das alterações fisiopatológicas que podem ocorrer em virtude de variadas doenças neurológicas.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

Função Vesicoesfinctérica normal – Neurofisiologia

O trato urinário inferior (TUI) realiza duas funções básicas: enchimento/reservatório de urina e esvaziamento. Para que essas funções possam ocorrer adequadamente, é necessário que ocorra relaxamento da musculatura lisa vesical (detrusor) e aumento coordenado do tônus esfinctérico uretral durante a fase de enchimento da bexiga, e o oposto durante a micção. A coordenação das atividades da bexiga e do esfincter uretral envolve uma complexa interação entre os sistemas nervosos (central e periférico) e fatores regulatórios locais, e é mediada por vários neurotransmissores.
O funcionamento da bexiga é coordenado em diferentes níveis do sistema nervoso central, localizados na medula, ponte e centros superiores, por meio de influências neurológicas excitatórias e inibitórias que se dirigem aos órgãos do trato urinário inferior e da aferência sensitiva destes órgãos. Perifericamente, o trato urinário inferior é inervado por três tipos de fibras: parassimpáticas; simpáticas e somáticas. A inervação vesical parassimpática origina-se de neurônios localizados na coluna intermédio-lateral dos segmentos S2 a S4 da medula e é conduzida pelo nervo pélvico até os gânglios localizados no plexo pélvico. Este se localiza lateralmente ao reto e origina as fibras parassimpáticas pós-ganglionares, que se dirigem para a bexiga. A inervação eferente simpática é originada no segmento toracolombar da medula, de T10 a L2, e direciona-se, através da cadeia simpática, ao plexo hipogástrico superior (pré-aórtico). A subdivisão caudal deste plexo forma o nervo hipogástrico, contendo os eferentes pós-ganglionares simpáticos para a bexiga e a uretra. A inervação da musculatura estriada do esfincter uretral é predominantemente somática. Origina-se no núcleo de Onuf, localizado no corno anterior de um ou mais segmentos da medula espinhal sacral (S2-S4). Fibras somatomotoras originadas deste núcleo inervam o esfincter uretral, por meio dos nervos pudendos, sem conexão em gânglios periféricos. Há evidências de que o esfincter uretral também receba influência simpática e parassimpática, a partir de ramos dos nervos hipogástrico e pélvico. Vias aferentes, partindo de receptores localizados na bexiga e na uretra, são responsáveis pela transmissão de informações vindas dos referidos órgãos para o sistema nervoso central (SNC). Dirigem-se para o plexo pélvico, de onde partem para a medula através dos nervos pélvico, hipogástrico e pudendo. Na medula, fazem sinapse com neurônios localizados no corno dorsal.
A atividade dos centros medulares é controlada por centros superiores, através de tratos descendentes cefalospinais. A micção é coordenada no tronco encefálico, especificamente na substância pontino-mesencefálica, denominado centro pontino da micção (CPM), que é a via final comum para os motoneurônios da bexiga, localizados na medula espinhal. Em circunstâncias normais, a micção depende de um reflexo espino-bulbo-espinal liberado pelo CPM. Este recebe influências do córtex cerebral, cerebelo, gânglios da base, tálamo e hipotálamo (influências suprapontinas), em sua maior parte inibitórios.
Resumidamente, pode-se descrever o ciclo miccional normal da seguinte forma:

1.    Enchimento: a distensão da bexiga leva à ativação progressiva dos nervos aferentes vesicais. Esta ativação é acompanhada pela inibição reflexa da bexiga, via nervo hipogástrico, e estimulação simultânea do esfincter externo via nervo pudendo. O CPM é continuamente monitorado sobre as condições de enchimento vesical, mantendo sua influência inibitória sobre o centro medular sacral, que inerva a bexiga, liberando progressivamente a ativação do esfincter externo.
2.    Esvaziamento: após alcançar um nível crítico de enchimento vesical e sendo a micção desejada naquele momento, o CPM interrompe a inibição sobre o centro sacral da micção (parassimpático), que ativa a contração vesical através do nervo pélvico. Ao mesmo tempo, a influência inibitória sobre a bexiga, feita pelo sistema simpático através do nervo hipogástrico, é interrompida e ocorre simultânea inibição da ativação somática do esfincter, relaxando o aparelho esfinctérico e garantindo a coordenação da micção. Pode-se descrever o ciclo miccional normal como um simples processo de “liga-desliga”, em que, em um primeiro momento, ocorre inibição dos reflexos da micção (inibição vesical por meio da estimulação simpática e inibição da estimulação parassimpática) e ativação dos reflexos de enchimento vesical (estimulação esfinctérica pudenda). Este mecanismo é alternado para ativação dos reflexos da micção (estimulação vesical parassimpática) e inibição dos reflexos de enchimento (inibição da ativação esfinctérica) e as duas fases vão se alternando seguidamente.

O conhecimento da neuroanatomia e neurofisiologia envolvida no controle da micção permitem antecipar quais os tipos de distúrbios miccionais que podem ocorrer secundários a patologias que acometem diferentes estruturas do sistema nervoso. O fator mais importante, neste sentido, é a localização das estruturas afetadas pela neuropatia:
Doenças acometendo estruturas do SN localizadas acima do tronco cerebral, geralmente resultam em contrações detrusoras involuntárias, com coordenação vésico-esfinctérica mantida. Os sintomas associados são geralmente de aumento da frequência miccional, urgência, urge-incontinência e noctúria. Raramente há deterioração do trato urinário inferior ou superior, já que a coordenação vésico-esfinctérica é preservada e as pressões vesicais são mantidas em níveis baixos. Entre as patologias neurológicas mais frequentes neste segmento, destacam-se os acidentes vasculares cerebrais, traumatismos e tumores cerebrais e a doença de Parkinson.
Nas doenças que acometem a medula espinhal acima do segmento sacral, o padrão mais frequente é de hiper-reflexia detrusora com dissinergismo vésico-esfinctérico. A interrupção da inibição do arco reflexo da micção associa-se à perda da coordenação do relaxamento esfinctérico, já que o CPM também está desconectado dos centros medulares da micção. As causas principais de lesões neste nível são os traumatismos raquimedulares, esclerose múltipla, mielodisplasia toracolombar (mielomeningocele) e doenças inflamatórias de diferentes etiologias, como a mielite pelo HTLV-1 (paraparesia espástica tropical), neuroesquistossomose medular e outras mielites de origem indeterminada. Nestes pacientes, os sintomas mais frequentes são incontinência urinária e dificuldade miccional. Na maioria dos casos, a sensibilidade vesical está abolida ou é inespecífica. A maioria dos pacientes apresenta elevação da pressão detrusora pela hiper-reflexia associada ao dissinergismo. O resíduo miccional também é elevado. Muitos podem evoluir com perda da complacência vesical e ITU de repetição. A associação de elevadas pressões vesicais e ITU de repetição, se não tratada, leva à deterioração progressiva da bexiga e do trato urinário superior, podendo ultimamente determinar a falência renal.
Nas lesões medulares acometendo segmentos abaixo de S2, a arreflexia detrusora é o padrão mais frequente, uma vez que o centro parassimpático da micção é lesado. O mecanismo esfinctérico pode ser afetado de várias maneiras, mas geralmente mantém um tônus moderado. Os pacientes com lesões neste nível geralmente apresentam sintomas de dificuldade miccional associados a perda total ou parcial da sensibilidade vesical. Podem apresentar incontinência por transbordamento. Por vezes, pode haver lesão predominante do núcleo de Onuf, responsável pela inervação do rabdoesfincter uretral. Nestas circunstâncias, pode ocorrer deficiência esfinctérica. As patologias que mais frequentemente acometem este segmento da medula são os TRM e as mielodisplasias, como a mielomeningocele lombossacral e as malformações sacrais.
As lesões que acometem estruturas periféricas podem ser bastante semelhantes às lesões dos segmentos medulares sacrais inferiores. Frequentemente, entretanto, o tônus esfinctérico pode ser muito baixo, podendo ocorrer deficiência esfinctérica severa. São causadas por traumatismos pélvicos severos e cirurgias pélvicas radicais, como amputação de reto e cirurgia de Wertheim-Meiggs.
Não é possível prever com exatidão o padrão de disfunção vésico-esfinctérica de um paciente com base exclusivamente no conhecimento do nível da lesão neurológica.
A fase da lesão também deve ser considerada na avaliação e no tratamento de algumas patologias neurológicas. No TRM agudo, há uma fase inicial de choque medular, com duração de dias a semanas, onde ocorre padrão de arreflexia detrusora. De forma semelhante, pacientes com AVC podem apresentar retenção urinária nos primeiros dias da lesão devido a uma fase transitória de arreflexia detrusora.

Classificação das Disfunções Miccionais Neurogênicas

Várias classificações foram propostas para descrever os padrões miccionais causados por lesões neurológicas. Atualmente, a classificação funcional proposta por Wein e Barret (1988) é a que tem recebido maior aceitação entre os especialistas e é a mais recomendada. Pode ser utilizada para pacientes com distúrbios miccionais de qualquer origem, não necessariamente neurogênicos. Classifica os distúrbios em problemas do enchimento vesical, do esvaziamento ou combinado (Tabela 1).

Tabela 1: Classificação funcional expandida das disfunções miccionais neurogênicas

Falha de armazenamento
Falha de esvaziamento
Causa vesical: hiperatividade (contrações involuntárias do detrusor), doença ou lesão neurológica, inflamação, idiopática, obstrução infravesical, déficit de complacência, doença ou lesão neurológica, fibrótica, hipersensibilidade, inflamatória/infecciosa, neurológica, psicológica
Causa vesical: neurológica, miogênica, psicogênica, idiopática
Causa infravesical: incontinência urinária de esforço genuína, falha de suporte suburetral, relaxamento do assoalho pélvico, hipermobilidade vésico-uretral, deficiência esfinctérica intrínseca, doença ou lesão neurológica, fibrótica, mista
Causa infravesical: anatômica, obstrução prostática, estenose do colo vesical, estenose uretral, compressão uretral, funcional, dissinergia do esfincter estriado, dissinergia do esfincter liso, mista


ACHADOS CLÍNICOS

Pacientes com doenças neurológicas podem apresentar-se com graus variados de deficiência mental e física, de tal forma que a abordagem de cada paciente deve ser individualizada. Nesta população, a severidade das co-morbidades e o status funcional são fundamentais para a definição da abrangência da investigação clínica e para o estabelecimento de metas de tratamento.
A avaliação clínica detalhada é a principal parte da investigação médica de pacientes apresentando-se com suspeita de distúrbios miccionais neurogênicos. Ela precisa caracterizar os sintomas miccionais, assim como o estado geral de saúde do paciente, sua saúde mental, história prévia de tratamentos urológicos e o impacto dos sintomas urinários sobre a qualidade de vida. O exame físico é fundamental para avaliar a presença de globo vesical, características da próstata, anormalidades genitais e da região sacral, prolapsos vaginais e déficits neurológicos. A partir desta avaliação, deve ser possível realizar um diagnóstico presuntivo e o direcionamento dos exames complementares, além da instituição de medidas terapêuticas iniciais.
A avaliação urológica deve incluir exames laboratoriais para pesquisa de ITU, hematúria e função renal, incluindo urina I, cultura e urocultura. Nos pacientes com micção espontânea, a medida do fluxo e resíduo são fundamentais. Idealmente, um diário miccional de 2 a 3 dias deve ser obtido para ajudar a caracterizar o padrão habitual de ingestão de líquidos, frequência miccional e severidade da incontinência (quando presente).
A avaliação radiológica deve ser individualizada podendo incluir uma simples ultra-sonografia de vias urinárias ou requerer uretrocistografia miccional/retrógrada (UCM/R), urografia intravenosa (UIV), estudos radioisotópicos ou tomografia computadorizada. Pacientes com bexiga neurogênica estão mais propensos a desenvolver diversas complicações do trato urinário como estenose uretral, refluxo vesicoureteral, litíase e deterioração do trato urinário. Como regra, pacientes com lesões neurológicas graves devem sempre realizar ultra-sonografia do aparelho urinário e uretrocistografia ao menos na investigação inicial.

Exames Urodinâmicos

Enquanto a indicação dos exames urodinâmicos em mulheres com incontinência urinária ou homens com LUTS é controversa, a maioria dos especialistas concorda com a sua realização liberal no diagnóstico e acompanhamento de pacientes com sintomas miccionais associados a doenças neurológicas.
Além disso, durante o curso da doença, alterações vesicais podem ocorrer, mudando o padrão miccional. Os exames urodinâmicos permitem identificar o tipo específico de disfunção miccional em cada paciente, possibilitando a instituição de tratamento apropriado. Outra importante utilidade dos exames urodinâmicos é a de identificar pacientes de risco para desenvolver complicações urológicas, permitindo intervenção precoce nestes pacientes.
Na urodinâmica, avalia-se a função de reservatório da bexiga e seu esvaziamento. 

Tratamento

O tratamento dos distúrbios miccionais neurogênicos segue princípios que se aplicam ao tratamento de outros pacientes com queixas urológicas. Deve-se levar em consideração a possibilidade de reversão da doença neurológica que, quando possível, deve ser prioridade. Algumas causas possivelmente reversíveis são a compressão da cauda equina por hérnia de disco ou tumores e as doenças infecciosas ou inflamatórias do SNC (neuroesquistossomose, cisticercose).
Os objetivos do tratamento incluem:

·  preservar ou recuperar o TUS;
·  minimizar os episódios de ITU;
·  permitir enchimento vesical com baixa pressão;
·  permitir esvaziamento vesical completo e com baixa pressão;
·  manter a continência urinária.

Estes objetivos devem ser obtidos preferencialmente sem o uso de cateteres, por meio de medidas bem aceitas pelo paciente e seus familiares. O programa de tratamento deve ser flexível, levando em consideração a vontade do paciente e seus familiares e a aplicabilidade de cada medida para cada paciente.
Aspectos como o prognóstico da doença neurológica, reversibilidade do tratamento, seus efeitos adversos, frequência e abrangência do seguimento urológico, melhor e pior evoluções clínicas possíveis em cada alternativa e métodos alternativos devem ser discutidos.
O tratamento deve sempre ser iniciado pelas medidas mais simples, reversíveis e com menos efeitos colaterais que possam atingir os objetivos do tratamento, procedendo gradualmente para procedimentos de maior complexidade e riscos.

Tratamentos para Melhorar o Enchimento Vesical

Os distúrbios miccionais neurogênicos frequentemente acompanham-se de anormalidades na fase de enchimento vesical, principalmente pela presença de hiperatividade detrusora, mas também podendo haver comprometimento da complacência vesical e da competência do mecanismo esfinctérico. As modalidades de tratamento para facilitar o enchimento vesical podem ser aplicadas de forma isolada ou conjuntamente nos pacientes com distúrbios miccionais neurogênicos.

Tratamento Comportamental

Esta categoria inclui diversos métodos e ações, que visam resgatar o controle vesical, aumentando a capacidade efetiva da bexiga. Não existe um protocolo único ou padronizado que seja seguido por todos os que aplicam os diferentes métodos de terapia comportamental. A educação do paciente é o elemento central dos tratamentos comportamentais. Este método tem aplicação limitada em pacientes com déficits cognitivos ou motores que impeçam sua compreensão ou execução das medidas.
Entre os métodos mais usados de tratamento comportamental destacam-se:

· adequação da ingestão de líquidos;
· treinamento vesical;
· fisioterapia pélvica;
· micção de horário, ou comandada para pacientes com deficiências físicas ou cognitivas;
· evitar potenciais irritantes vesicais (cafeína, refrigerantes, álcool etc.).

O diário miccional tem um papel importante no tratamento, mantendo os pacientes envolvidos diretamente no seu tratamento e permitindo avaliar o volume urinado e identificar os que precisam restringir a ingestão de líquidos.
O uso de terapias enfocando o assoalho pélvico é também parte importante do protocolo de tratamento comportamental proposto por diferentes autores. A contração da musculatura do assoalho pélvico (exercícios de Kegel) é usada pelos pacientes para inibir uma contração vesical inicial ou iminente. O mecanismo de funcionamento baseia-se na inibição fisiológica do arco reflexo miccional promovida pela contração do esfincter estriado da uretra. Muitas vezes, os pacientes são incapazes de isolar e contrair eficientemente a musculatura pélvica. Nestas circunstâncias, o biofeedback e a estimulação elétrica podem ser muito úteis como medidas auxiliares, capacitando os pacientes a localizar e utilizar a musculatura do assoalho pélvico de maneira eficiente.
Os resultados do tratamento comportamental são bastante satisfatórios em pacientes sem déficits motores e sensitivos severos. São, de maneira geral, simples, baratos, eficientes e isentos de efeitos colaterais.

Tratamento Farmacológico

A maioria das drogas neste grupo destina-se ao tratamento da hiperatividade detrusora. Vale ressaltar que muitos pacientes com diagnóstico de déficit de complacência podem apresentar um componente de hiperatividade detrusora associado (contrações tônicas) e, por esta razão, podem se beneficiar do tratamento farmacológico.
Embora diversos neurotransmissores possam ser alvos do tratamento farmacológico dos distúrbios da micção, sabe-se que a contração das fibras musculares lisas da bexiga é mediada predominantemente pela estimulação colinérgica de receptores muscarínicos pós-ganglionares. Cinco subtipos de receptores muscarínicos foram identificados, sendo denominados M1 a M5. Na bexiga humana e de vários outros mamíferos, predominam os subtipos M2 e M3, sendo que os receptores M3 são os principais responsáveis pela contração vesical. Portanto, drogas que possam bloquear estes receptores são mais eficientes em reduzir a hiperatividade detrusora.
Uma vez que a estimulação colinérgica muscarínica é o principal mecanismo de contração vesical em humanos, drogas antimuscarínicas são a principal alternativa farmacológica para o tratamento da hiperatividade detrusora. De acordo com a Agência Americana de Política de Saúde e Pesquisa (AHCPR) e o Consenso Brasileiro de Incontinência Urinária, os anticolinérgicos são os agentes farmacológicos de primeira escolha para o tratamento desta condição clínica. Entretanto, como os receptores muscarínicos M2 e M3 estão presentes no organismo em diversos outros órgãos além da bexiga (como as glândulas salivares, trato intestinal, coração e olhos), drogas que atuam nestes receptores podem afetar a função destes órgãos, explicando dois dos mais frequentes efeitos colaterais resultantes do uso de drogas antimuscarínicas: boca seca e constipação.
A oxibutinina é o agente antimuscarínico mais usado no tratamento da hiperatividade detrusora e tem sua eficácia clínica bem documentada. É um potente antagonista de receptores muscarínicos, com discreta seletividade para receptores M3 e M1 em relação aos outros subtipos. Aparentemente, possui também uma ação espasmolítica direta sobre o detrusor, provavelmente mediada por antagonismo ao Ca2+ e uma ação anestésica local. Acompanham-se frequentemente de efeitos antimuscarínicos adversos, particularmente boca seca, e também constipação, visão turva e sonolência, levando à interrupção do tratamento ou diminuição da dose para um nível de menor eficácia terapêutica. Com o intuito de aumentar a tolerabilidade da oxibutinina, diversas novas táticas têm sido propostas, como a administração intravesical ou intra-retal da droga, pílulas de liberação prolongada e uso concomitante de estimuladores da salivação.
A tolterodina é um potente antagonista competitivo de receptores muscarínicos na musculatura lisa detrusora. Embora não possua especificidade para nenhum dos cinco subtipos de receptores muscarínicos, estudos demonstraram seletividade para a bexiga em relação às glândulas salivares, o que pode diminuir a incidência de efeitos colaterais. Sua eficácia clínica e tolerabilidade foram avaliadas em diversos estudos controlados, que demonstraram eficácia semelhante à da oxibutinina, com menor incidência de efeitos colaterais.
Outras drogas anticolinérgicas ou com mecanismos de ação mistos, como darifenacina, brometo de propantelina, brometo de emeprônio, cloreto de trospium, diciclomina, propiverina e flavoxato, foram e/ou continuam sendo utilizadas com sucesso variável no tratamento da HD. Devido aos seus efeitos colaterais e menor eficácia, ou por não terem sido estudados suficientemente, são pouco utilizados na prática clínica. Alguns não estão disponíveis no Brasil.

Outras Opções no Tratamento Farmacológico da Hiperatividade Detrusora

Os conhecidos efeitos colaterais das drogas antimuscarínicas têm promovido interesse em alternativas farmacológicas para o tratamento da hiperatividade detrusora. Diversas áreas do SNC estão envolvidas no controle da micção, incluindo estruturas supramedulares (córtex, diencéfalo, ponte) e medulares. Neurotransmissores como glutamato, serotonina, noradrenalina, dopamina e o ácido gama-aminobutírico (GABA) atuam no SNC e possuem ação inibitória ou excitatória no controle da micção, podendo ser alvos de tratamento farmacológico. Entretanto, eles estão envolvidos em muitas outras funções do SNC, e drogas que atuem nos seus receptores podem afetar outros sistemas. Embora representem uma importante área de pesquisa farmacológica para os distúrbios da micção, ainda não foram desenvolvidas drogas com atuação no SNC que apresentem eficácia e segurança clínica no tratamento da hiperatividade vesical.
Sabe-se que os receptores alfa-adrenérgicos localizados no detrusor estão envolvidos no relaxamento da musculatura lisa vesical. A possibilidade de usar agonistas beta-3-adrenérgicos no tratamento da HD é muito promissora, mas sua eficácia e segurança ainda precisam ser demonstradas em estudos clínicos controlados.
Drogas que agem no canais de K+, como a cromacalina e o pinacidil, demonstraram efeito inibitório sobre as contrações detrusoras em animais, mas os estudos clínicos não foram animadores, pois estas drogas possuem efeito mais potente sobre a musculatura lisa dos vasos sanguíneos e os níveis requeridos para inibição da bexiga causam elevada frequência de efeitos colaterais. Novas drogas estão em investigação e parecem apresentar maior especificidade para a musculatura lisa da bexiga.
Os antidepressivos tricíclicos são muito utilizados no tratamento da HD. O mecanismo de ação destas drogas é complexo e parece incluir efeitos sedativos e anticolinérgicos sobre o SNC, atividade anticolinérgica periférica e bloqueio da recaptação de neurotransmissores, como a serotonina e a noradrenalina. A imipramina é a principal droga dentro desta categoria no tratamento da HD. Embora tenha efeitos anticolinérgicos sistêmicos pronunciados, sua ação antimuscarínica direta sobre o detrusor é pequena. Exerce, entretanto, um efeito inibitório direto sobre o detrusor cujo mecanismo não é conhecido. Clinicamente, alguns estudos demonstraram bons resultados com a imipramina no tratamento da HD.

Bloqueio da Aferência Vesical

Uma opção no tratamento da HD é o uso intravesical de drogas bloqueadoras da aferência da bexiga. As duas principais drogas neste grupo são a capsaicina e a resiniferatoxina.
A capsaicina é uma neurotoxina extraída de pimentas vermelhas que exerce um efeito bifásico nos nervos sensitivos, inicialmente causando sua excitação e, em seguida, determinando um período prolongado de bloqueio com resistência à ativação por estímulos habituais. As fibras C e possivelmente também as fibras Ad são bloqueadas com o uso intravesical da capsaicina. Diversos estudos clínicos foram conduzidos em pacientes com HD causada por lesão medular e demonstraram melhora clínica e urodinâmica com o uso da capsaicina. Observou-se, entretanto, uma incidência importante de efeitos colaterais, como dor suprapúbica, urgência miccional, hematúria e disreflexia autonômica.
A resiniferatoxina é um análogo da capsaicina muito mais potente que esta na dessensibilização da aferência vesical, mas com menor potencial de produzir inflamação da bexiga. Assim, apresenta eficácia semelhante, mas com efeitos colaterais menos intensos. A duração dos efeitos destas drogas varia de 2 a 7 meses, requerendo nova aplicação após este período.

Toxina Botulínica no Tratamento da Hiperatividade Detrusora

Uma alternativa nova e bastante promissora no tratamento da hiperatividade detrusora é a injeção de toxina botulínica, por via endoscópica, na musculatura lisa vesical (detrusor). A toxina botulínica é a neurotoxina mais potente conhecida e tem sido utilizada clinicamente desde a década de 1970. Ela bloqueia seletivamente a liberação da acetilcolina pelas terminações nervosas por meio da inibição do transporte das vesículas pré-sinápticas, causando desnervação funcional que pode durar até 6 a 9 meses.
O conhecimento do exato mecanismo de ação da toxina botulínica e o espectro de doenças capazes de serem tratadas com esta droga têm aumentado progressivamente. Vários estudos demonstraram sua eficácia no tratamento de variadas condições clínicas como cefaléias tensionais, síndromes dolorosas miofasciais, distonia, espasticidade, acalasia de esôfago e hiperidrose. Na urologia, a toxina botulínica tem sido usada com sucesso no tratamento da dissinergia vésico-esfinctérica. Estudos preliminares indicam que a injeção da toxina botulínica na musculatura lisa vesical bloqueia a transmissão nervosa parassimpática na bexiga e determina importante melhora clínica em pacientes com hiperatividade detrusora.
Resultados do tratamento da hiperatividade detrusora com injeção endoscópica de toxina botulínica mostram que a capacidade vesical aumenta significativamente e a pressão detrusora máxima é reduzida, com mínimos efeitos colaterais e com efeitos sobre a bexiga mantendo-se por6 a 9 meses.

Tratamentos Invasivos

O uso de técnicas invasivas de neuromodulação e/ou de procedimentos cirúrgicos no tratamento da HD, como ampliação ou desnervação vesical, é geralmente reservado para pacientes com hiperatividade detrusora severa, notadamente aqueles com patologias medulares como traumatismo raquimedular e mielomeningocele. Entre os indivíduos sem doença neurológica, só devem ser considerados naqueles com sintomas muito severos e que tenham sido submetidos a múltiplos tratamentos conservadores sem sucesso.
As técnicas de neuromodulação podem ser utilizadas tanto para o tratamento da HD como para promover o esvaziamento vesical. O tratamento da HD baseia-se na estimulação das raízes aferentes de S2-S4 pela implantação de um eletrodo que é conectado a um gerador de pulsos. Este transmite continuamente impulsos de baixa intensidade para as raízes referidas, resultando em aumento reflexo da estimulação simpática sobre a bexiga e inibição da atividade parassimpática sobre ela, inibindo o reflexo da micção. Antes da implantação definitiva do eletrodo e do gerador de pulsos, o paciente é submetido a um teste com eletrodos percutâneos e a resposta clínica é avaliada. Diversos estudos demonstraram bons resultados com a neuromodulação em pacientes com HD refratária ao tratamento farmacológico. Os altos custos do tratamento, sua invasividade e potenciais complicações como dor, migração do eletrodo, infecções e mau funcionamento do aparelho contribuem para que esta modalidade permaneça como alternativa para casos selecionados de pacientes com HD.
As técnicas de desnervação são alternativas para o tratamento da HD refratária. Podem ser feitas em diferentes níveis (nervos sacrais, nervos pélvicos ou na própria bexiga) e por meio de métodos variados como injeção de substâncias neurotóxicas, interrupção cirúrgica das estruturas nervosas ou lesão das mesmas por fontes de energia como a radiofrequência. Entre as muitas técnicas de desnervação propostas, a rizotomia sacral posterior é a mais eficiente no tratamento da HD refratária, mas só é utilizada em pacientes com lesões medulares completas. Visa interromper completamente a aferência vesical, abolindo o arco reflexo da micção e tornando a bexiga arreflexa. Vários autores relataram bons resultados com esta técnica de desnervação vesical no tratamento da HD.
As cirurgias de ampliação vesical têm sido utilizadas em pacientes com HD severa e com comprometimento da capacidade e complacência vesicais. A maior parte dos candidatos a estas cirurgias é portadora de patologias medulares como traumatismo raquimedular e mielomeningocele. A maioria das cirurgias de ampliação é feita com uso de segmentos intestinais, notadamente o íleo e o cólon. Ambos apresentam bons resultados, mas uma taxa significativa de complicações a curto e longo prazo, limitando sua indicação aos pacientes que não obtiveram melhora com métodos menos invasivos. Por causa dos riscos de complicações, métodos alternativos de ampliação como a auto-ampliação, o uso do ureter ou de segmentos intestinais desepitelisados e técnicas de engenharia de tecidos vêm sendo utilizados ou estão em desenvolvimento. Apesar destes avanços significativos, cada um destes métodos possui limitações, e a ampliação com segmentos intestinais permanece sendo a alternativa mais eficiente para a ampliação vesical.

Tratamentos para Aumentar a Resistência Uretral

O comprometimento do mecanismo esfinctérico do trato urinário inferior pode decorrer de distúrbios em um ou mais dos seus componentes:

·  inervação do esfincter e assoalho pélvico;
·  propriedades estruturais do músculo liso e/ou estriado esfinctéricos;
·  elementos intrínsecos da uretra;
·  estruturas do assoalho pélvico.

Tais alterações podem ocorrer em decorrência de processos degenerativos, traumatismos externos ou iatrogênicos, bem como de patologias neurológicas ou musculares.
As alternativas medicamentosas para aumento da resistência uretral são poucas e de eficiência bastante limitada. Os agonistas alfa-adrenérgicos são o principal representante. Sua ação concentra-se principalmente sobre as fibras musculares lisas do colo vesical que possuem alta concentração de receptores alfa-adrenérgicos. Quando estimulados, tais receptores promovem a contração destas fibras musculares e determinam um aumento da resistência uretral. Existem vários agentes neste grupo, porém, como não se trata de drogas com ação específica sobre o trato urinário, a sua administração frequentemente associa-se a efeitos colaterais como aumento da pressão arterial, ansiedade, insônia, cefaléia, fraqueza, taquicardia e outras arritmias cardíacas, devendo ser evitadas em pacientes com patologias cardiocirculatórias e em idosos. A efedrina e a fenilpropanolamina (norefedrina) são as principais drogas nesta categoria.
Entre os pacientes com distúrbios neurogênicos, os tratamentos farmacológicos para aumento da resistência uretral são raramente utilizados. As condições neurológicas que costumam reduzir a ação do mecanismo esfinctérico uretral são principalmente as doenças que afetam os segmentos sacrais (S2-4, onde se localiza o núcleo de Onuf) ou os nervos periféricos para o esfincter uretral (pudendo), como os disrafismos da coluna (mielomeningocele), os TRM baixos e as lesões periféricas causadas por cirurgias pélvicas radicais. Tipicamente, os tratamentos mais aplicados e que se acompanham de melhores resultados nestes pacientes são a implantação do esfincter artificial, a injeção de substâncias como colágeno ou silicone no colo vesical e as cirurgias de Sling para pacientes do sexo feminino (nestes casos, faz-se Sling obstrutivo, com o objetivo de tornar a paciente retencionista). Em todos estes casos, existe uma grande chance de que o paciente passe a necessitar de cateterismo intermitente.

Tratamentos para Melhorar o Esvaziamento Vesical

A melhora do esvaziamento vesical de pacientes com distúrbios neurogênicos é frequentemente um dos maiores desafios para o urologista. Há poucas alternativas farmacológicas que geralmente mostram-se pouco eficientes. Neste sentido, um avanço importante foi a introdução do cateterismo intermitente. É utilizado atualmente como forma de esvaziamento vesical em diversas condições urológicas, não somente de causa neurológica. Esta técnica contribuiu muito para diminuir a morbidade associada ao uso crônico de cateteres uretrais, além de melhorar a qualidade de vida dos pacientes.

Falência da Contração Vesical

A incapacidade de gerar uma contração detrusora eficiente tem óbvias implicações sobre a fisiologia da micção. Um dos principais aspectos necessários para o esvaziamento vesical adequado é a capacidade vesical de gerar uma contração eficiente. Quando esta não ocorre, a micção é ineficiente e ocorrem sintomas como jato fraco e intermitente, necessidade de uso de prensa abdominal e sensação de esvaziamento vesical incompleto. Outros sintomas, como aumento da frequência urinária e incontinência urinária por transbordamento, podem ocorrer em virtude da incapacidade da bexiga esvaziar-se. O quadro clínico dos pacientes com contratilidade vesical diminuída pode acompanhar-se de infecções urinárias de repetição, litíase vesical e outras complicações progressivas como fibrose vesical, refluxo vesicoureteral e comprometimento do trato urinário superior.

Alternativas Terapêuticas para Tratar Problemas da Contração Vesical

1.    Compressão externa e/ou manobra de Valsalva

As manobras de Credé (compressão manual externa) e Valsalva (uso de prensa abdominal) podem ser eficientes em pacientes capazes de gerar uma pressão abdominal significativamente elevada (acima de 50 cmH2O) e que possuam resistência uretral diminuída. É um mecanismo não-fisiológico de micção que sofre a resistência das mesmas forças que fisiologicamente impedem as perdas urinárias aos esforços. O afunilamento fisiológico do colo vesical durante a micção não ocorre com as manobras de esforço e pode haver aumento na resistência uretral na vigência de manobras de elevação da pressão abdominal. Assim, os pacientes que têm mais chances de se beneficiar desta forma de tratamento são os que possuem algum grau de incontinência urinária e comprometimento esfinctérico associado à falência da contração vesical.

2.    Tratamento farmacológico

Pouca ou nenhuma melhora clínica pode ser obtida com os tratamentos farmacológicos disponíveis atualmente. Drogas que imitam a ação da acetilcolina poderiam ser eficientes no tratamento de pacientes com diminuição da contratilidade vesical, uma vez que o maior estímulo farmacológico para a contração detrusora é promovido pela ativação de receptores colinérgicos muscarínicos da membrana celular. A acetilcolina não pode ser usada clinicamente devido às suas ações no sistema nervoso central e nos gânglios do sistema nervoso periférico e também porque é rapidamente hidrolisada no organismo. Existem inúmeras drogas parassimpatomiméticas, mas apenas o cloreto de betanecol apresenta um perfil farmacológico de relativa seletividade para o trato urinário, com mínima ação sobre receptores nicotínicos e pouco suscetíveis à colinesterase. Sua ação estimuladora da contratilidade vesical já foi demonstrada in vitro em vários estudos. Embora seja usada clinicamente para melhorar a contratilidade vesical, não há evidências clínicas suficientes para recomendar seu uso. Além disso, efeitos colaterais possíveis incluem náuseas, vômitos, diarréia, cefaléia, aumento da salivação e sudorese.

3.    Cateterismo vesical intermitente

O tratamento atual de escolha para a maioria dos pacientes com falência da contração vesical de qualquer etiologia é o cateterismo vesical intermitente. Apesar dos grandes benefícios que confere aos pacientes, o cateterismo intermitente acompanha-se de vários inconvenientes e riscos, como:

·  possibilidade de infecção urinária;
·  possibilidade de lesão uretral, vesical ou litíase;
·  necessidade de que o paciente tenha sempre cateter uretral e outros materiais necessários ao cateterismo;
·  maior gasto de tempo para realizar as micções (que são bem mais demoradas através do CIL);
·  piora da auto-estima e imagem corpórea ou outros distúrbios psicológicos relacionados com a necessidade de utilizar o cateter uretral;
·  dor ou desconforto para a passagem do cateter nos pacientes sem alteração da sensibilidade uretral;
·  necessidade de ajuda para realizar o cateterismo nos pacientes com limitações motoras e/ou cognitivas. Desta forma, embora a maioria dos pacientes aprenda facilmente a realizar o CIL, sua aceitação não é boa entre todos os pacientes, que manifestam constantes interesse em alternativas terapêuticas que possam oferecer a possibilidade de recuperar o esvaziamento vesical espontâneo.

4.    Drogas que reduzem a resistência uretral

Diferentemente de outras áreas da bexiga, o colo vesical e a musculatura lisa prostática possuem rica inervação alfa-adrenérgica que promove contração de suas fibras. Desta forma, a utilização de alfabloqueadores pode promover relaxamento da musculatura lisa a este nível, reduzindo a resistência ao fluxo urinário. Isto pode ser útil no tratamento de pacientes portadores de dificuldade de esvaziamento tanto por uma hiperatividade do colo vesical (como a que ocorre em certos tipos de lesão medular – dissinergia de esfincter interno) como em portadores de hiperplasia prostática benigna. Contudo, estas drogas são muito pouco úteis em portadores de distúrbios neurogênicos, notadamente naqueles com dissinergismo vésico-esfinctérico.

Alternativas Terapêuticas para Tratar Problemas do Dissinergismo

Tratamentos Cirúrgicos

Os tratamentos nesta categoria visam principalmente tratar a hipertonia do esfincter externo, responsável pelas altas pressões vesicais e seus efeitos deletérios sobre a bexiga e o TUS. Incluem-se nesta categoria a esfincterotomia, o uso de stents uretrais para bypass do esfincter externo, a dilatação do esfincter com balão uretral e as cirurgias de desnervação do esfincter, com interrupção do nervo pudendo. Todas elas visam reduzir ao máximo a resistência uretral, tornando o paciente incontinente e requerendo o uso de um coletor externo. Desta maneira, não são utilizadas em pacientes do sexo feminino. Nestas e nos pacientes do sexo masculino cuja uretra não é uma boa alternativa de cateterismo (por estenose severa, fístula etc.), as derivações continentes podem ser uma excelente alternativa, realizando-se o cateterismo intermitente pelo estoma.
Um novo tratamento que está em fase de testes é o uso da toxina botulínica no esfíncter externo. Sua ação causa uma paralisia da musculatura estriada e uma diminuição da hipertonia esfinctérica, possibilitando ao paciente que urine espontaneamente. Um outro uso para a toxina botulínica no esfíncter é para pacientes que apresentam arreflexia detrusora e que fazem uso de cateterismo intermitente limpo. Após a aplicação da toxina no esfincter, o paciente passa a urinar alguns dias após com manobras de Credé ou Valsalva, sendo possível a retirada do cateterismo intermitente limpo. Esse procedimento pode deixar o paciente incontinente após a aplicação, mas estudos mostraram que casos de incontinência são muito raros, que essa é uma técnica promissora e que, no futuro próximo, fará parte dos recursos para tratar esse tipo de problema.


Esfincter Artificial para homens com incontinência urinária

Para homens com incontinência urinária severa, ou seja, com perdas urinárias contínuas e ou em grande volume a melhor forma de tratamento para melhorar estas perdas podendo deixa-lo inclusive totalmente seco é a colocação de uma torneirinha artificial em sua uretra denominada esfíncter artificial. Desta forma ele poderá abrir esta suposta torneirinha na hora de urinar e fecha-la ao terminar, evitando ou diminuindo sensivelmente suas perdas. A principal causa de incontinência urinária masculina que pode levar à necessidade de colocação do esfíncter artificial é a Prostatectomia Radical, ou seja, a cirurgia para tratamento do câncer da próstata. No entanto, cirurgias para tratamento de doenças benignas da próstata, traumatismos pélvicos e da uretra, cirurgias locais extensas e algumas doenças neurológicas também podem levar a uma incontinência severa e, portanto a necessidade de se implantar um esfíncter artificial.



A seguir expomos o esquema da colocação do esfíncter artificial AMS 800: 




- Cuff - O cuff envolve a uretra.
- Balão - O balão é implantado ao lado da bexiga.
- Tubos e conexões - Os tubos e conexões que conectam as três partes do esfíncter permitem a movimentação do fluxo entre as partes.

Bomba: A bomba é colocada no escroto e pode ser sentida através da pele. Sua parte inferior é mole e compressível e a parte superior, contendo o botão de desativação é rígida.

- Botão de desativação - Pequeno botão palpável na parte superior (rígida) da bomba.

Como funciona o esfíncter artificial

O cuff, que contém líquido comprime a uretra levemente, de forma a mantê-la fechada e impedir o vazamento de urina. Para urinar, o cuff é esvaziado através da compressão da bomba por 2 a 3 vezes, o que promove a movimentação do líquido do cuff em direção ao balão. Vazio, o cuff descomprime a uretra abrindo-a e permitindo a passagem da urina e você pode urinar tranquilamente. Após alguns minutos, o líquido automaticamente retorna do balão fechando o cuff e a uretra novamente.




1- Quando o cuff está cheio ele fecha a uretra e a urina permanece na bexiga; 
2- Após apertar a bomba o cuff se esvazia e se abre, abrindo a uretra e assim a bexiga pode se esvaziar; 
3- Após alguns minutos o líquido automaticamente retorna para o cuff que volta a ocluir a uretra.

Uso do esfíncter artificial para urinar 

- Palpe a bomba no seu escroto.
- Com uma mão segure suavemente o tubo acima da bomba para mantê-la fixa no escroto.
- Com a outra mão aperte e solte a parte inferior da bomba (mole) por 2 a 3 vezes até que ela fique murcha. Em seguida o cuff se abrirá e aí você poderá urinar.





- Aperte e solte a parte mole inferior da bomba algumas vezes para abrir o cuff e urinar.
- Para voltar a reter a urina na bexiga você não precisa fazer nada, pois o líquido retornará automaticamente do balão para o cuff em alguns minutos voltando a manter a uretra fechada. Após ativar o esfíncter algumas vezes, você aprenderá o tempo que o cuff demora para se reencher e fechar novamente a uretra.




O cuff reenche automaticamente. 

Botão de desativação do esfíncter artificial:

O esfíncter artificial possui um botão de desativação que permite que o médico desative seu aparelho. Quando este está desativado o cuff fica vazio e você fica incontinente. Seu médico geralmente deixa o esfíncter desativado nas primeiras 6 a 8 semanas após a cirurgia para permitir uma boa cicatrização. Seu médico poderá discutir com você a possibilidade de desativar o esfíncter em circunstâncias específicas.

O que ocorre se você ativar o botão de desativação acidentalmente?

Se você apertar o botão de desativação localizado na parte superior rígida da bomba seu aparelho fica desativado e você poderá ficar incontinente ou obstruído pelo cuff, dependendo se o cuff desativou-se vazio ou cheio. Na eventualidade de ocorrer alguma destas coisas, você perceberá que a bomba está diferente, e poderá facilmente resolver o problema.

Como reativar o esfíncter? 

Se a parte inferior macia da bomba estiver mais dura que o habitual:

Com uma mão segure suavemente o tubo acima da bomba para mantê-la fixa no escroto.
Com a outra mão aperte forte e rapidamente a parte inferior da bomba (mole) e depois mais 2 a 3 vezes como você normalmente faz.
Informe rapidamente o seu urologista se sua tentativa de reativação falhar.

O que fazer se a parte mole inferior da bomba não se reenche automaticamente como é normal?

Com uma mão segure suavemente o tubo acima da bomba para mantê-la fixa no escroto. 
Com a outra mão aperte as laterais da parte rígida superior da bomba. Faça uma pressão forte e duradoura. Quando a parte mole inferior da bomba se encher completamente de novo, aperte-a forte e rapidamente.
Caso não tenha sucesso na primeira vez, repita novamente todo o procedimento.
Contate seu urologista se sua tentativa de reativação falhar.


A colocação de Esfíncter Urinário Artificial é direito do paciente.


Pacientes com incontinência urinária provocada pela remoção da próstata têm direito ao procedimento que melhor lhe assegure a saúde, sob pena de violação de seu direito à dignidade humana

O câncer de próstata é o sexto tipo de câncer mais comum no mundo e o mais prevalente em homens, representando cerca de 10% do total das neoplasias. As taxas de incidência são cerca de seis vezes maiores nos países desenvolvidos, se comparados aos países em desenvolvimento. É considerado o câncer da terceira idade, uma vez que cerca de três quartos dos casos no mundo ocorrem a partir dos 65 anos.
Detectado cada vez mais cedo, os índices de cura dessa doença estão cada vez maiores. Entre as formas de tratamento, a remoção cirúrgica da próstata, ou prostatectomia, é a mais comum, tanto para os pacientes em estágio precoce da doença, quanto para aqueles que falharam em responder à radioterapia.
No entanto, apesar dos excelentes resultados quanto ao tratamento do câncer, a prostatectomia pode trazer complicações ao paciente, tais como impotência e incontinência urinária. Em muitos casos, o paciente é curado do câncer, mas se vê obrigado a inconvenientes como, por exemplo, o uso diário de fraldas.
A boa notícia é que a incontinência urinária é tratável e geralmente curável na grande maioria das vezes. Atualmente, em casos de remoção radical da próstata, a colocação do esfíncter urinário artificial é considerado o tratamento mais eficiente para esse tipo de sequela.
O problema é que os Planos de Saúde quase sempre negam a autorização para implante do esfíncter, trazendo para os pacientes uma série de transtornos. As alegações mais comuns para a falta de cobertura são: a) falta de previsão contratual para custeio de despesas relativas a implantes e próteses de qualquer natureza e b) ausência de previsão no rol dos procedimentos obrigatórios da Agência Nacional de Saúde – ANS. Em verdade, a negativa se dá em razão do alto custo do procedimento.
A postura adotada pelos Planos de Saúde é ilegal, abusiva e afronta o Código de Defesa do Consumidor.
Com efeito, se a colocação do esfíncter urinário artificial decorre de ato cirúrgico coberto pelo plano, sendo conseqüência possível da cirurgia de extirpação radical da próstata, diante de diagnóstico de câncer, a cláusula que proíbe a cobertura é nitidamente ilegal.
Não se trata, como alegam os convênios, de uma simples colocação de prótese. Trata-se de material utilizado como meio para o próprio sucesso da cirurgia, sem o qual esta se tornaria inócua. A colocação do esfíncter, nesse caso, é ato intrínseco ao ato cirúrgico que se mostra indispensável ao tratamento do paciente.
Ora, se há cobertura contratual para a realização da prostatectomia radical, é indispensável que também haja a cobertura decorrente de suas implicações, sob pena de atenuar ou exonerar indevidamente a responsabilidade do fornecedor do serviço (art. 51, I, do CDC).
Não se pode admitir que os planos de saúde arquem com parte dos custos do tratamento do paciente (cirurgia de prostatectomia), negando, posteriormente, o pagamento do implante de esfíncter artificial, imprescindível ao total restabelecimento de sua saúde e de sua dignidade.
Assim, uma vez demonstrada que a implantação do esfíncter urinário artificial é a melhor solução para o paciente, é possível buscar o Poder Judiciário para forçar o Plano de Saúde a custear o tratamento, nos exatos termos definidos pelo médico. Vale dizer, ainda, que a injusta negativa pelos Planos de Saúde também pode gerar indenização por danos morais aos pacientes, ante a dor e constrangimento por que passaram.
Aqueles que se encontram nessa situação devem procurar um advogado especialista para fazer valer os seus direitos.

INCONTINÊNCIA URINÁRIA FEMININA


Incontinência é a perda involuntária de urina da bexiga em situações impróprias, devendo ser objetivamente demonstrável. A incidência de incontinência urinária na mulher aumenta com a idade, atingindo 25% após a menopausa.
A perda involuntária de urina atua de forma devastadora na qualidade de vida da paciente e pode ser adequadamente tratada.
Estima-se que existam mais de 30 milhões de mulheres incontinentes só nos EUA.

Como se desenvolve?

A perda de urina pode ocorrer de forma transitória, geralmente associada ao uso de fármacos, a infecções (infecção urinária, vaginites), a constipação ou problemas de deficiência hormonal, desaparecendo após o tratamento da causa subjacente; ou pode ser persistente ou definitiva com instalação e piora progressiva.
Muitas mulheres tornam-se incontinentes após o parto, histerectomia (cirurgia para retirada do útero) ou mesmo outros traumas na região pélvica.
Entre os tipos mais comuns de perda de urina existe a incontinência urinária de esforço ou estresse: a perda de urina ocorre quando há um aumento repentino da pressão intra-abdominal como tossir, espirrar, rir, pular, correr ou realizar algum esforço.

Como se faz o diagnóstico?

O diagnóstico é clínico, baseado em uma história detalhada. Devemos investigar o inicio dos sintomas, descartando a presença de infecção urinária, cálculos, tumores, doenças associadas como DM, neuropatias e uso de medicamentos. Durante o exame físico pede-se para a paciente tossir, tentando reproduzir a perda urinária. Também pode ser realizado um teste onde um cotonete é inserido na uretra para determinar sua posição e mobilidade. Um exame de análise da urina deve ser realizado. Um teste urodinâmico vai determinar se existem outras alterações da bexiga e da uretra.

Como se trata?

O tratamento vai depender do tipo e das causas da incontinência urinária.
Inclui medidas gerais identificando as possíveis causas da perda de urina, tais como: 

Perder peso.
Parar de fumar para diminuir a tosse crônica.
Tratar a constipação

O alivio dos sintomas pode ser conseguido:

Com alguns medicamentos específicos.
Com a fisioterapia de exercícios para o assoalho pélvico, chamados de Exercícios de Kegel (pode melhorar até 75% dos sintomas).
Com o uso de cones vaginais com pesos diferentes.
Técnicas atuais incluem o uso de eletro-estimuladores.

Também podem ser usadas técnicas que injetam colágeno ao redor da uretra e mesmo cirurgias para corrigir o problema específico.

Como se previne?

Para a prevenção deve-se instituir a rotina dos Exercícios de Kegel, principalmente após o parto vaginal e após cirurgias sobre a região pélvica.

Perguntas que você pode fazer ao seu médico

Os exercícios perineais são úteis no tratamento da incontinência urinária?
Existem dispositivos que ocluem mecanicamente a uretra, controlando a perda urinária?
O tratamento medicamentoso pode ser uma alternativa a cirurgia no manejo da perda de urina?
A cirurgia é eficaz no tratamento da incontinência urinária?
Existe diferença de resultados entre as principais técnicas cirúrgicas?


TRATAMENTO CLÍNICO DA INCONTINÊNCIAURINÁRIA FEMININA


Os melhores resultados no tratamento da incontinência urinária feminina são alcançados através dos procedimentos cirúrgicos. Entretanto há mulheres que não aceitam a operação, outras desejam ter mais filhos e muitas vezes existem contraindicações clínicas à cirurgia.
Várias opções de tratamento conservador podem ser utilizadas, como veremos a seguir, e a escolha deve respeitar o correto diagnóstico da etiologia da incontinência e a associação ou não de contrações não inibidas do detrusor.

Drogas Alfa-Agonistas

A uretra possui receptores alfa-adrenérgicos que quando estimulados por medicamentos, aumentam o tônus da musculatura lisa periuretral. Três drogas são clinicamente utilizadas: fenilpropanolamina, efedrina e imipramina. Os efeitos colaterais desses agentes incluem aumento da pressão arterial, palpitações e insônia. Devem ser evitados em pacientes hipertensos, cardiopatas ou com hipertireoidismo. Os resultados são pouco satisfatórios para a incontinência severa. 

Estrógenos

Após a menopausa ocorre diminuição dos parâmetros do perfil pressórico uretral. Essas alterações se devem à redução dos níveis de estrogênio. A reposição hormonal provoca hipertrofia da mucosa uretral, melhora o fluxo dos vasos da submucosa, aumenta a sensibilidade dos receptores adrenérgicos e o desempenho da musculatura lisa.
A medicação pode ser administrada por via oral, intramuscular, aplicação de creme vaginal ou adesivos cutâneos.
A associação de drogas alfa-agonistas ao tratamento hormonal parece melhorar os resultados. Cerca de 70% das pacientes melhoram da incontinência após doze semanas.

Exercícios para o assoalho pélvico

Na década de 40, Arnold Kegel introduziu os exercícios para fortalecimento da musculatura pélvica. A paciente inicia o aprendizado durante a micção, tentando interromper o jato sem mover as pernas. É orientada a repetir a contração da musculatura periuretral da mesma maneira por dez vezes. A cada semana o número de exercícios é acrescido até alcançar 30 a 45 minutos ao dia. Melhora da incontinência pode ser observada após três meses. Os resultados são comparáveis aos obtidos com a fenilpropanolamina.
Outra maneira de fortalecer o assoalho pélvico é o uso do cone intra-vaginal. Para conseguir reter o cone a paciente tem que contrair a musculatura pubococcígea sem aumentar a pressão abdominal. O peso dos cones varia de 20 a 100 gramas. Deve-se manter o cone dentro da vagina por 15 minutos e progressivamente utilizar cones mais pesados. Os resultados mostram melhora subjetiva de 30 a 63%.
Os exercícios pélvicos exigem grande motivação da paciente para manter a aderência ao tratamento

Biofeedback

É um método de aprendizado ou reeducação no qual a paciente poderá visualizar ou ter percepção tátil de um acontecimento fisiológico inconsciente. Ela deve aprender a contrair a musculatura pubococcígea ao redor dos dedos do examinador durante o toque vaginal. A contração deve ser visualizada podendo-se utilizar transdutores de pressão ou eletrodos que forneçam documentação gráfica ou imagens onde a paciente possa observar o que ocorre e comprovar o seu progresso.
A monitorização da pressão do detrusor auxilia no tratamento da incontinência associada à instabilidade vesical. As limitações do método incluem a motivação da paciente e sua capacidade intelectual para compreender o funcionamento do tratamento.

Estimulação Elétrica

A estimulação elétrica do nervo Pudendo pode causar contração direta do assoalho pélvico e através da medula espinhal gerar uma estimulação reflexa do nervo Pélvico que resultará em relaxamento do detrusor.
Utilizam-se eletrodos na vagina ou no ânus conectados a um pequeno gerador externo. As aplicações devem ser diárias com duração de 20 minutos. A principal limitação é o desconforto da paciente. O método pode ser utilizado na incontinência de esforço genuína ou na associação com hiperatividade do detrusor. Os resultados são promissores embora o uso clínico ainda seja pequeno.

Controle da Instabilidade do Detrusor

A presença de contrações não inibidas pode gerar urgência miccional ou mesmo incontinência urinária. Pode ser fator coadjuvante na incontinência de esforço. A etiologia é pouco conhecida, logo, a resposta à medicação é pouco previsível.

Anticolinérgicos

Essas drogas procuram bloquear a contração do detrusor mediada pela inervação parassimpática. As mais usadas são: propantelina, emeprônio e oxibutinina. Essa última possui ação anestésica local e relaxante direta do músculo liso. É a mais efetiva no tratamento das contrações não inibidas.
Outros grupos de medicamentos menos utilizados são: antidepressivos tricíclicos (imipramina), bloqueadores de canal de cálcio (terodiline) e relaxantes musculotrópicos (flavoxato).
Em resumo, o tratamento clínico da incontinência urinária feminina deve ser indicado para as mulheres com alto risco para cirurgias. Os resultados mais satisfatórios ocorrem quando os sintomas e defeitos anatômicos são leves ou moderados.

 

Cirurgia para incontinência urinária


A cirurgia para a incontinência urinária feminina é feita com a colocação de uma fita cirúrgica chamada TVT - Tension Free Vaginal Tape ou TOV - Tape and Trans Obturator Tape, também chamada de Sling, que é colocada sob a uretra para apoiá-la, dando um apoio extra ao períneo.
A cirurgia é feita sob anestesia local ou epidural e tem 80% de chances de sucesso, sendo indicada para casos de incontinência urinária de esforço que não tenham tido o resultado esperado após mais de seis meses de tratamento com os exercícios de Kegel e fisioterapia.
No caso da incontinência urinária masculina a cirurgia pode ser necessária à colocação de um esfíncter artificial.

Cuidados após a cirurgia da incontinência urinária


Após a cirurgia da incontinência urinária devem-se ter os seguintes cuidados:

·                     Evitar fazer esforços por no mínimo 15 dias. Não pode fazer exercícios, abaixar, pegar peso ou levantar-se bruscamente;
·                     Devem-se ingerir bastantes alimentos ricos em fibras para evitar a prisão de ventre;
·                     Evitar ficar resfriado, tossir ou espirrar no 1º mês (evitando locais fechados com aglomeração);
·                     Lavar a zona genital com água e sabonete neutro sempre após urinar e evacuar;
·                     Usar calcinhas de algodão;
·                     Não usar absorvente interno;
·                     Não ter relações íntimas por no mínimo 40 dias;
·                     Não tomar banho de banheira, de piscina ou de mar para evitar o contato com água contaminada.

Além disso, recomenda-se deixar de fumar, evitar o aumento de peso e os exercícios físicos de grande impacto como o body pump e o box, por exemplo, para evitar o reaparecimento da incontinência urinária.

A incontinência urinária aos esforços (IUE) é definida por perda involuntária de urina pela uretra secundária ao aumento da pressão abdominal. O colo vesical e a uretra proximal são normalmente estruturas intra-abdominais e repousam sobre o diafragma pélvico. Estas estruturas são posicionadas de determinada maneira que as haja uma distribuição de forças equivalente para a bexiga e para a uretra durante o aumento da pressão intra-abdominal.
O advento da interpretação urodinâmica da IUE levou a considerarem-se dois mecanismos fisiopatológicos principais, na gênese dos sintomas. No primeiro, considerado o mais comum, o colo vesical e a uretra manteriam sua função esfincteriana e, para que ocorresse a perda urinária, seria necessária a transmissão desigual durante o aumento da pressão abdominal, consequente à perda do suporte natural da uretra e do colo vesical. Esta situação é denominada hipermobilidade uretral, e, em termos práticos, corresponderia a uma "hérnia" dos elementos do assoalho pélvico responsáveis pelo suporte uretral. No segundo, a uretra perderia sua função esfincteriana intrínseca, devido às alterações anátomo-funcionais seja na mucosa ou submucosa uretral, no envoltório muscular liso do tecido espongioso uretral ou no rabdoesfincter, disposto mais externamente e derivado dos músculos do assoalho pélvico. Nessa situação, a perda urinária ocorreria aos mínimos esforços. As uretropexias nestes casos têm um índice de falha de 15 a 20%. Por outro lado, as técnicas para a restauração do suporte suburetral, como os slings têm índices de sucesso de até 95%%. Outra teoria, apresentada mais recentemente por Petros e Ulmsten, considera que a incontinência urinária não é inteiramente um processo passivo, sendo consequente à insuficiência da ação dos músculos pubococcígeo, elevador do ânus e relaxamento do ligamento pubouretral, permanecendo a uretra aberta ao esforço.
Além disso, outro fator responsável seria o enfraquecimento da parede vaginal, responsável pelo suporte das terminações nervosas um do colo vesical e pela transmissão das forças geradas pelos músculos do assoalho pélvico.
A tendência atual é considerar que na etiopatologia da IUE apresenta certo grau de deficiência esfincteriana intrínseca, o que direciona o tratamento de todas essas mulheres para a cirurgia de sling.

Anatomia cirúrgica do assoalho pélvico feminino.

O suporte anatômico da uretra, do colo vesical e da parede posterior da bexiga deriva primariamente da fáscia do músculo elevador do ânus, que se insere lateralmente no arco tendíneo do músculo elevador do ânus ao nível do ramo ísquio-púbico. Esta fáscia apresenta uma face voltada para a região retropúbica e outra voltada para a parede vaginal anterior e seus feixes estendem-se medialmente envolvendo a uretra e o colo vesical na forma de um "sanduíche".
No nível da uretra, condensações desta fáscia originam os ligamentos uretropélvicos e os ligamentos pubouretrais, ambos com a função de prevenir a hipermobilidade uretral, além de envolvidos com o mecanismo esfincteriano intrínseco.
Os ligamentos pubouretrais sustentam a uretra contra o ramo inferior da sínfise púbica, apresentando um espessamento que divide a uretra em três regiões funcionalmente distintas. a região proximal, também denominada de intra-abdominal, relaciona-se à continência passiva, secundária à transmissão das variações da pressão abdominal, atuando conjuntamente com o colo vesical. A região intermediária dois compreende o terço médio da uretra, responsável pelo mecanismo esfincteriano ativo. A região distal ao ligamento pubouretral tem apenas função sobre a condução urinária, sem envolvimento com o mecanismo de continência.
Os ligamentos uretro-pélvicos correspondem a espessamentos da fáscia do músculo elevador do ânus que se estendem paralelamente à uretra deste o seu terço médio até o colo vesical nas posições correspondentes as três e 9 horas, inserindo-se lateralmente no arco tendíneo do músculo elevador do ânus. Têm a função de sustentar a uretra e o colo vesical além de promoverem um aumento da resistência uretral. Durante um aumento da pressão abdominal, como na tosse ou espirro, ocorre uma contração reflexa do músculo elevador do ânus, aumentando a tensão ao nível dos ligamentos uretro-pélvicos que promovem a suspensão e compressão da uretra.
Posteriormente, a fáscia do músculo elevador do ânus estende-se sob a parede vesical posterior até a cérvix uterina, sendo denominada de fáscia vésico-pélvica (ou fáscia pubocervical), responsável pelo suporte destas estruturas bem como da parede vaginal anterior.
A fáscia vésico-pélvica está diretamente relacionada ao aparecimento da cistocele, que se origina do adelgaçamento da região central desta fáscia ou de defeitos ao nível da sua inserção no arco tendíneo do músculo elevador do ânus, sendo comum a associação destas duas condições do ponto de vista clínico.
Os ligamentos sacro-uterinos são estruturas músculo-fasciais que se originam da parede póstero-superior da cérvix uterina inserindo-se na parede lateral do sacro. Os três ligamentos cardinais correspondem à condensação de feixes da fáscia do músculo elevador do ânus que se originam nas paredes laterais da cérvix uterina, inserindo-se lateralmente ao nível do arco tendíneo do músculo elevador do ânus. Estas estruturas em conjunto constituem o suporte do útero e da cúpula vaginal, completando a sustentação do assoalho pélvico feminino.
O conhecimento destes conceitos é fundamental para a compreensão das alternativas utilizadas para o tratamento cirúrgico da incontinência urinária.
Etiologia da insuficiência esfincteriana intrínseca cirurgias prévias. A prevalência da insuficiência esfincteriana intrínseca entre as pacientes submetidas a duas cirurgias para correção da incontinência urinária é superior a 75 %%. Suturas aplicadas muito próximas da uretra podem dificultar o fechamento uretral ou causar angulações uretrais. A exerese de divertículos uretrais pode determinar alterações sobre a inervação uretral ou lesão esfincteriana direta. Cirurgias com dissecção sacral extensa, como nas amputações abdominoperineais do reto e histerectomia radical podem causar lesões dos plexos pélvicos determinando insuficiência esfincteriana, atonia ou baixa complacência vesical, dependendo do local exato e extensão da lesão. Desta forma, outros componentes podem estar envolvidos na fisiopatologia da incontinência nestas situações, devendo ser valorizados na avaliação pré-operatória.

TRATAMENTO CIRÚRGICO ATUAL

1 Colposuspensão vesical Cirurgia de Burch

Em 1958, John C.Burch aperfeiçoou a técnica de Marshall-Marchetti Krantz, suturando a fáscia paravaginal no ligamento de Cooper ao invés do periósteo, evitando uma das complicações desta técnica que é a osteíte púbica. O sucesso referido neste procedimento é na ordem de 85%. O objetivo é manter o colo vesical em posição intra-abdominal, através de sua suspensão. Visa, portanto, a correção da hipermobilidade do colo vesical.

2 Sling pubovaginal autólogo

Devido à importância atribuída no passado ao colo vesical no mecanismo esfincteriano intrínseco, as técnicas desenvolvidas inicialmente tinham a finalidade de promover compressão a este nível, através da confecção de alças dispostas cirurgicamente no nível do colo vesical.
A cirurgia é realizada através de uma incisão de Pfanenstiel com exposição da aponeurose do músculo reto abdominal, sendo dissecada uma faixa de cerca de 8 cm de comprimento por 1,5 cm de largura.
Recomenda-se que a faixa seja suficientemente longa para alcançar o espaço retropúbico e que dessa forma propicie a formação de um apoio posterior, refazendo a anatomia normal. o enxerto é transposto para a vagina através do espaço retropúbico com auxílio de uma agulha de suspensão endoscópica, e a região central do enxerto é suturada ao nível do colo vesical, evitando-se qualquer tensão local. A cirurgia é realizada sob controle cistoscópico, a fim de permitir o diagnóstico de uma lesão vesical inadvertida.
A seguir, o sítio doador da aponeurose do músculo reto abdominal é suturado com fio inabsorvível e a cirurgia é completada com as suturas da pele e da parede vaginal.
No pós-operatório é avaliado o volume residual, sendo o cateter retirado se o mesmo for inferior a 30 % do volume urinário total.
No caso de volumes residuais superiores, a 5 paciente é mantida com o cateter uretral até o quinto pós-operatório quando nova tentativa de retirada é realizada. Pacientes com retenção urinária persistente são mantidas em programa de auto-cateterismo intermitente limpo.

3 Slings pubovaginais sintéticos

Uma das técnicas padrão para o tratamento cirúrgico das portadoras de incontinência urinária de esforço é o sling pubovaginal autólogo. Este preferência em relação aos materiais sintéticos se devia, em grande parte, a duas preocupações principais:

infecção do implante e erosão uretral. No entanto, o emprego de slings sintéticos permite a redução do tempo cirúrgico, evita a realização de incisões abdominais extensas para a obtenção da faixa aponeurótica, determinando menor tempo de hospitalização e reduzindo o desconforto pós operatório.
Vários materiais sintéticos e heterólogos foram propostos para a confecção das alças pubovaginais sendo o polipropileno o mais aceito.
O TVT (tension-free vaginal tape) é aplicado sem tensão, minimizando o problema de erosão uretral. A mudança do paradigma não reside apenas na eliminação da tensão, mas também na colocação do sling no terço médio da uretra e não no colo vesical, pois de acordo com a teoria integral da continência, o ligamento pubouretral em conjunto com a musculatura do assoalho pélvico faz da uretra média a região mais importante da continência urinária feminina.
A técnica inclui a dissecção com tesoura de Metzenbaum de um túnel submucoso vaginal pelo qual é inserida a faixa de polipropileno conectada às agulhas especiais em suas extremidades, substituindo-se a abertura convencional da fáscia endopélvica, por apenas duas punções, o que reduziu a possibilidade da criação de defeitos laterais a este nível (figura 4 e 5). Os índices de cura aproximam-se de 90% em seguimento que até seis anos.
Os slings denominados de terceira geração foram desenvolvidos visando permitir o ajuste pós-operatório caso a paciente apresente retenção urinária persistente ou permaneça incontinente. Um desses slings, denominado SAFYRE (sling auto fijable y regulable), é confeccionado por uma faixa de polipropileno central de cinco cm, conectada a duas colunas de silicone de grau médico de formato multicônico com a finalidade de se autofixarem na região suprapúbica. Este formato permite, no pós-operatório recente, ajustes da tensão empregada, sem a necessidade de um procedimento de maior morbidade. Além do sling, o conjunto é constituído por uma agulha desenvolvida para a inserção seja anterógrada (a partira da região suprapúbica), retrógrada (através de punção vaginal) ou transobturatória dependendo da preferência e do treinamento específico do cirurgião. Sua indicação é preferencialmente vantajosa nas pacientes com obesidade, onde a exerese da aponeurose do músculo reto abdominal é particularmente difícil; nas pacientes com falhas cirúrgicas prévias, e nos casos de hipocontratilidade do músculo detrusor, devido a sua possibilidade de ajuste caso ocorra retenção urinária prolongada.

INJEÇÕES PERIURETRAIS

As injeções periuretrais têm por objetivo aumentar a resistência uretral sendo indicadas no tratamento da insuficiência esfincteriana intrínseca isolada. De forma geral, 7 os resultados com esta técnica na presença de hipermobilidade uretral associada são ruins, o que implica em uma seleção cuidadosa das pacientes.
Teflon. A injeção periuretral da pasta de politetrafluoretileno (teflon) foi proposta para o tratamento da incontinência urinária de esforço em 1973. Embora não existam relatos a respeito de complicações do ponto de vista clínico, estudos experimentais demonstraram a possibilidade de migração de partículas fagocitadas deste polímero além do desenvolvimento de reação granulomatosa do tipo corpo estranho no local de implantação o que limita seu usa na clínica.
Silicone. A utilização dos micro-implantes de silicone, compostos de silicone vulcanizado não foi popularizado. Tecnicamente trata-se de material menos susceptível à fagocitose e migração devido ao seu maior diâmetro (100 a 300 µm), quando comparado ao teflon.
Colágeno. Este material é composto de colágeno dérmico bovino altamente purificado, não pirogênico e tratado com glutaraldeido imerso em solução salina fisiológica. No momento, a maior dificuldade para a popularização do emprego do colágeno bovino é o seu alto custo, principalmente considerando-se a necessidade de duas ou mais sessões de injeção para a obtenção de continência duradoura.
Engenharia Tecidual. Em virtude do grande desenvolvimento tecnológico, estão sendo estudados materiais que não provocam rejeição pelo receptor. Estes materiais derivam das próprias células do indivíduo e são manipulados de tal forma para que possam ser injetados na uretra. Estes materiais provêm da cultura de condrócitos, miócitos e colágeno humano. No entanto, esta tecnologia ainda não está disponível ainda para uso clínico.